Poesia Contemporânea e Moderna
segunda-feira, 23 de outubro de 2023
domingo, 24 de setembro de 2023
quinta-feira, 3 de agosto de 2023
sexta-feira, 31 de março de 2023
Eu chamo




segunda-feira, 5 de dezembro de 2022
terça-feira, 1 de novembro de 2022
Noite de Amores
Mimoso leito de flores,
Mimosos, lânguidos ais!
Vergôntea débil ainda,
Tremia! Lua tão linda,
Lembra-me ainda... Jamais!
Aquela dália mimosa,
Aquele botão de rosa
Dos lábios dela... Senhor!
Murchavam; mas, como a Lua,
Passava a nuvem: «Sou tua»!
Reverdeciam de amor!
E aquela estátua de neve
Como é que o fogo conteve
Que não a vi descoalhar?
Ondas de fogo, uma a uma,
Naquele peito de espuma
Eram as ondas do mar!
Como os seus olhos me olhavam,
Como nos meus se apagavam,
E se acendiam depois!
Como é que ali confundidas
Se não trocaram as vidas
E os corações de nós dois!
Mimosa noite de amores,
Mimoso leito deflores,
Mimosos, lânguidos ais!
Vergôntea débil ainda,
Tremia! Lua tão linda,
Lembra-me ainda... Jamais!
João de Deus, in 'Campo de Flores'
domingo, 30 de outubro de 2022
quinta-feira, 27 de outubro de 2022
sábado, 1 de outubro de 2022
Paixão
Com essa vista embaciada e turva
Que dá aos olhos entranhável dor,
Tinhas podido ver transpor a curva
Pouco a pouco do líquido horizonte
A barca saudosa que levasse
Aquele a quem primeiro uniste a face
E o teu primeiro amor!
Depois, que toda mágoa e saudade,
Da mesma rocha ou alcantil deserto,
Olhando avidamente para o mar...
Vias na solitária imensidade
Vagas ficções de um pensamento incerto
Surgir das ondas, desfazer-se em espuma,
Não alvejando nunca vela alguma...
E sempre a suspirar!
Até que à luz de uma intuição sublime
De alma arrancavas o gemido extremo
De saudade, desespero e dor!...
Pois é assim que eu sofro, assim que eu gemo,
Que nuvem negra o coração me oprime,
Nuvem de mágoa, nuvem de ciúme,
Em te não vendo à hora do costume...
Meu anjo e meu amor!
João de Deus, in 'Campo de Flores'
quinta-feira, 15 de setembro de 2022
quinta-feira, 1 de setembro de 2022
Attracção
Que posso até dizer,
Só acham n'alma objectos
Que os possam entreter;
Meus olhos... coisa rara!
Porque hão de em ti parar
Como a corrente pára
Em encontrando o mar!?
E penso n'isto, scismo...
Mas é tão natural
Cahir-se no abysmo
D'uma belleza tal!...
Olhei!... Foi indiscreta
A vista que te puz.
A pobre borboleta
Viu luz... cahiu na luz!
Uma attracção mais forte
Que toda a reflexão,
(É fado, é sina, é sorte!)
Me arrasta o coração...
João de Deus
in 'Ramo de Flores'
sábado, 27 de agosto de 2022
quarta-feira, 24 de agosto de 2022
terça-feira, 23 de agosto de 2022
terça-feira, 9 de agosto de 2022
sábado, 6 de agosto de 2022
segunda-feira, 1 de agosto de 2022
Anseio
Oh, quem me dera embalado
Nesse berço vaporoso,
Nuvens do céu azulado...
Onde os meus olhos repouso
Já de tanto olhar cansado!
De tanto olhar à procura
De um bem que o fosse deveras;
De uma paz, de uma ventura
Dessas venturas sinceras,
Se as pode haver sem mistura.
Neste desejo entranhável!
Há-de haver um rosto, um seio
De amor e gozo inefável
Donde mesmo este amor veio!
Este amor que a vós me prende,
Nuvens do céu azulado!
E a vós, lâmpadas que acende
Depois do Sol apagado
Quem... de Quem tudo depende!
João de Deus, in 'Campo de Flores'
sexta-feira, 22 de julho de 2022
quarta-feira, 6 de julho de 2022
segunda-feira, 4 de julho de 2022
Iniciação ao Diálogo
De início bastará que olhes mais vezes
na mesma direcção hoje evitada
(estandartes nos olhos são mais leves
do que no coração duros tambores),
ainda que o teu olhar próprio não rompa
as lajes de ódio com que te muraste.
II
O vento e chuva e tempo, sobre a pedra
passando sempre, hão-de gastá-la: um dia,
antes que a obture o musgo ou algum pássaro
aí faça o ninho fofo, encontrarás,
entre o lado que afirmas teu e o outro,
uma réstia de azul — o azul de todos.
III
Talvez rumor de passos, para além
do muro atravessado aos teus desígnios...
Não porás terra onde se pôs o céu:
ver o que diz o ouvido agora queres,
e onde a rocha fendeu-se cabe um olho
humano e mais a boca do fuzil.
IV
Provando frágil o que acreditavas
inexpugnável, eis que em ti se fixam
atentos outro olho e outro fuzil!
V
Contemplador e contemplado, hesitas
aprendendo na espera o inesperado:
lares como os que tens, jardins iguais
aos teus, o mesmo verde nas lavouras,
no gado solto a mesma desmemória,
na gleba o mesmo esforço pelo outono...
Até na cara do inimigo existe
algo de teu, nunca ao espelho visto.
VI
Adormenta-se o dedo no gatilho,
força é movimentá-lo.
(Maior força
é suportar as formigas do sangue,
a cãimbra incipiente; maior força
é desfazer os nós de engano e medo;
maior força é manter silente a máquina
da morte e só do peito abrir a fala.)
VII
Posta nas pautas máximas da voz,
a palavra resvala entre os granitos
— lava e incêndio primeiro, fumo após,
nuvem, neblina ténue. Claridade.
VIII
Que cresce, a poucos dedos de teus dedos?
É o mapa da amizade que se espalma
na palma de outra mão:
toca essa mão
e o tacto há-de explicar-te geografias
tão permeáveis e altas que seus mares
(só de o pensares) já em tuas veias correm
salgando as ondas que em teus olhos morrem.
Geir Nuffer Campos, in 'Canto Claro'
sexta-feira, 1 de julho de 2022
Sol do meu dia
Se eu fosse nuvem tinha imensa mágoa
Não te servindo de asas maternais
Que te pudessem abrigar da água
Que chovesse das mais!
E sendo eu onda, tinha mágoa suma
Não te podendo a ti, mulher, levar
De praia em praia sobre a alva espuma,
Sem nunca te molhar!
E sendo aragem eu, que pela face
Te roçasse de rijo alguma vez
Que o Senhor com mais força respirasse...
Que mágoa imensa... Vês?
E a luz do teu olhar que me não luza
Um rápido momento a mim sequer,
Como a águia no ar, que passa e cruza
A terra sem na ver!
Mas que me importa a mim! Se me esmagasses
Um dia aos pés o coração a mim,
As vozes que lhe ouviras, se escutasses,
Era o teu nome... sim;
O teu nome gemido docemente,
Com toda a fé de um mártir em Jesus.
Se acaso já em Cristo pôs um crente
A fé que eu em ti pus!
A fé, mais o amor! Porque ele expira
Sem que a ninguém lhe estale o coração;
E eu, se essa luz dos olhos me fugira,
Sobrevivia? Não.
Assim como em ti vivo, morreria
Também contigo, se uma vez (que horror!)
Te visse pôr, ó Sol!... Sol do meu dia!
Astro do meu amor!
João de Deus, in 'Campo de Flores'