A diferença entre a Guerra e a Paz é a seguinte:
na Guerra, os pobres
sâo os primeiros a serem mortos;
na Paz, os pobres são os primeiros a
morrer.
Para nós, mulheres, há ainda uma outra diferença:
na Guerra,
passamos a ser violadas por quem não conhecemos
As nossas estradas já tiveram a timidez dos rios
e a suavidade das
mulheres.
E pediam licença antes de nascer.
Agora, as estradas tomam
posse da paisagem e estendem as suas
grandes pernas sobre o Tempo, como
fazem os donos do mundo
Sorte a dos que, deixando de ser humanos, se tornam feras.
Infelizes os
que matam a mando de outros e mais infelizes
ainda os que matam sem ser a
mando de ninguém.
Desgraçados, enfim, os que, depois de matar, se olham
ao
espelho e ainda acreditam serem pessoas.
Eis a armadilha da glória: quanto maior for a vitória,
mais o herói será
perseguido e cercado pelo passado.
Esse passado devorará o presente.
Não importa quantas condecorações recebeu ou venha a receber:
a única
medalha que, no final, lhe irá sobrar é a triste e fatal solidão.
Diz a mãe: a vida faz-se como uma corda.
É preciso trançá-la até não distinguirmos os fios dos dedos.
A estrada é uma espada.
A sua lâmina rasga o corpo da terra.
Não tarda
que a nossa nação seja um emaranhado de cicatrizes,
um mapa feito de
tantos golpes que nos orgulharemos mais das
feridas que do intacto corpo
que ainda conseguimos salvar.
Mia Couto (citações)
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