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| Herberto Helder |
era preciso chamá-lo sem voz -
difundia uma colorida multiplicação de mãos,
e aparecia depois todo nu escutando-se a si
mesmo, e fazia de estátua durante um parque
inteiro, de repente voltava-se e acontecera
um crime, os jornais diziam, ele vinha em
estado completo de fotografia embriagada,
descobria-se sangue, a vítima caminhava
com uma pêra na mão, a boca estava
impressa na doçura intransponível da pêra,
e depois já se não sabia o que fazer, ele era
belo muito, daquela espécie de beleza repentina
e urgente, inspirava a mais terrível acção
do louvor, mas vinha comer às nossas mãos,
e bastava que tivéssemos muito silêncio para isso, e então os dias
cruzavam-se uns pelos outros e no meio habitava uma montanha intensa,
e mais tarde às noites trocavam-se e no meio o que existia agora era uma
plantação de espelhos, o Amor aparecia e desaparecia em todos eles,
e tínhamos de ficar imóveis e sem compreender, porque ele era uma
criança assassina e andava pela terra com as suas camisas brancas
abertas, as suas camisas negras e vermelhas todas desabotoadas.

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