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quarta-feira, 30 de junho de 2021

Às Vezes Entre a Tormenta

Às vezes entre a tormenta,
quando já umedeceu,
raia uma nesga no céu,
com que a alma se alimenta. 


E às vezes entre o torpor
que não é tormenta da alma,
raia uma espécie de calma
que não conhece o langor. 


E, quer num quer noutro caso,
como o mal feito está feito,
restam os versos que deito,
vinho no copo do acaso. 


Porque verdadeiramente
sentir é tão complicado
que só andando enganado
é que se crê que se sente. 


Sofremos? Os versos pecam.
Mentimos? Os versos falham.
E tudo é chuvas que orvalham
folhas caídas que secam. 


Fernando Pessoa, in 'Cancioneiro'

1 comentário:

- R y k @ r d o - disse...

Fernando Pessoa um poeta exemplar que muito gosto de ler. Poema divino. Grato pela partilha.
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Cumprimentos poéticos
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Pensamentos e Devaneios Poéticos
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