Folheou páginas dos pecados e elas sorriram desavergonhadas.
Os rabiscos
quase apagados jogaram-lhe na face o ardor de mil
beijos escondidos sob
os mantos das árvores.
Enquanto inocentes cinderelas retornavam dos
encantos e magias
em horas determinadas ela fugia, descalça e de
camisola assanhada,
dos guardiões da pureza e candura.
Liberta, sob o
olhar feiticeiro da lua, percorria a noite enquanto
o chão era feito de
sombras de folhas rendadas.
O vento aqui e acolá assoviava alcovitando
os momentos furtivos.
Era ela, cega aos perigos, tão espevitada,
recusava pureza,
fitas e laços, soltando os cabelos para o vento
bolinar, sempre
rumando para o que lhe atiçava emoção.
Os olhos tremeram
quando as páginas se despiram e ela reviu um
corpo quente em bronze
luzidio, dentes alvos e lábios polpudos.
O olhar de um mar noturno em
tempestade trazia a nau para misteriosas viagens.
Navegava no momento
como um rodopio de valsa.
A paixão flutuava numa dança de pecado - Foi
pecado?
- As páginas tremem, interrogando-a neste patamar do tempo e
mostram
também seu retorno sorrateiro, no primeiro raio da aurora, para o
calor dos lençóis
e do travesseiro que nunca cansaram de ouvir suas
confidências e preces
para que suas travessuras não fossem descobertas.
Pedia perdão aos céus, com a promessa de não cometer de novo – mas tudo
se repetia,
pois uma voz sempre exigia sussurrando-lhe no coração: se o
sabor tem o doce
néctar da flor, para que pedir perdão se esses pecados
são feitos de amor?
- Leu e releu por um bom tempo o versinho grifado e
fechou o velho diário,
sem remorsos, deixando dormir as páginas
amarelecidas de insubordinação.
Mary Santos

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