Tem dias que sou, no vento, fiapo à deriva
às vezes sou grão de nevasca,
engatada num caule,
gelada lasca
a translúcida gema
d'um Olmo ou Carvalho
pra mais tarde ser
o verde talhe de um veleiro
ou a sombra...
d' um frondoso galho
tem dias que sou
aqueles pesados passos que remam dunas
vou levantando areia de um planalto desértico,
com um cajado n'alma
tendo o semblante quase profético...
vou-me aplumando por dentro da poeira
formatando meu vulto
- este ser meio sepulto;
com saudade e pele a mostras
pra não perder o movimento
vou-me equilibrando no tempo
pra não cair no esquecimento
assim ziguezagueio meus dias
... que d'outra maneira
palavras me teriam.............
se eu não fosse esse andarilho
com um velho bornal
querendo encontrar
aquela ave-poesia ...?
aquele pássaro que em mim não pousa
e que por isso sempre tento rabiscar numa lousa
um nicho recheado de fantasias que o atraia
como se fosse preenchido com as mais requintadas
iguarias.............................................
Mary Santos
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